Publicações

Desprovido de razão prática previsível, eivado de subjetivismo e contradições

Nosso sistema jurídico, forjado na tradição romano-germânica ou na chamada civil law, tem suas bases em um ordenamento escrito, positivado de forma clara e completa, a fim de balizar a interpretação da lei pelos juízes.

Com efeito, o princípio da legalidade está insculpido na Constituição da República como cláusula pétrea. Logo, a lei escrita, fruto do processo legislativo, há de ter maior valor frente às demais fontes de direito.

Diferentemente é a tradição do sistema anglo-saxão, da common law, cuja principal fonte irradiadora é a jurisprudência. No sistema também chamado de costumeiro-jurisprudencial, a lei não é a mais importante fonte, sua marca caracterizadora se dá no direito baseado, primordialmente, nos usos e costumes consagrados pelos precedentes firmados através das decisões dos Tribunais.

A prática forense brasileira demonstra uma aproximação, sui generis, entre os dois sistemas de matrizes diferentes.

Vê-se, por aqui, no contexto de um direito positivado, cuja essência deveria residir no respeito estrito às leis, um modelo de vinculação às decisões judiciais, representado na figura dos precedentes judiciais, de modo que o direito acaba deixando de ser o que a lei textualmente diz para corresponder àquilo que o juiz diz sobre a lei. Conforme sintetizou Antônio Pereira Gaio Júnior[1], “não é a lei a ratio, mas sim o que a Corte afirma como a interpretação correta da lei”.

Ocorre que, afora a primeira instância, temos os Tribunais de Justiça dos Estados, os Tribunais Regionais Federais, o Superior Tribunal de Justiça e, em última instância, o Supremo Tribunal Federal, sendo que, na prática, cada juiz ou turma julgadora decide de acordo com a sua “ciência e consciência”, como gosta dizer em seus votos o ministro Marco Aurélio Mello.

Nem mesmo as Súmulas do STF, que deveriam ser vinculantes, a teor do art. 103-A da Constituição, são verdadeiramente respeitadas, basta ver a dificuldade que muitos defensores ainda enfrentam, diuturnamente, para ter acesso à íntegra de investigações a fim de exercer a defesa técnica de seus constituintes.

O cenário é de instabilidade. As decisões dos nossos Tribunais Superiores não são respeitadas pelos órgãos de hierarquia inferior, quando, na realidade, deveria haver “um esforço conjunto do Judiciário no sentido da uniformização de suas decisões de modo a que os jurisdicionadas possam desenvolver suas atividades pautados em condutas constitucionais”.[2]

É justamente nesse contexto que se insere a recente decisão da 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que aceitou o pedido de Flávio Bolsonaro para que a investigação de suposto esquema criminosos na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro deixe a 1ª instância e passe a ser processado pelo Órgão Especial do Tribunal.

Isso porque, referida decisão, adotada por maioria de votos no TJRJ, contraria frontalmente entendimento firmado no STF, em 2018, sobre as regras de foro privilegiado, segundo o qual a prerrogativa de foro se limita aos crimes cometidos no exercício do cargo e em razão dele.[3] Ou seja, cessado o mandato ou deixando o cargo que gerava a prerrogativa de foro, o caso deve ir para a primeira instância.

Como bem resumiu o ministro Marco Aurélio Mello: “É o Brasil. É o faz de conta. Faz de conta que o Supremo decidiu isso, mas eu entendo de outra forma e aí se toca. Cada cabeça uma sentença”.[4]

Como se vê, temos um direito jurisprudencial à moda brasileira, desprovido de razão prática previsível, eivado de subjetivismo e contradições. Uma jabuticabeira frondosa. Não nos faltará jabuticaba.

Alexandre de Oliveira Ribeiro Filho – Advogado criminalista, integrante do escritório Vilardi Advogados. Especialista em direito penal econômico pela GVlaw e pelo IBCCrim; possui LLM em Direito Internacional e Justiça Criminal pela UEL – Londres.

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Desprovido de razão prática previsível, eivado de subjetivismo e contradições

Nosso sistema jurídico, forjado na tradição romano-germânica ou na chamada civil law, tem suas bases em um ordenamento escrito, positivado de forma clara e completa, a fim de balizar a interpretação da lei pelos juízes.

Com efeito, o princípio da legalidade está insculpido na Constituição da República como cláusula pétrea. Logo, a lei escrita, fruto do processo legislativo, há de ter maior valor frente às demais fontes de direito.

Diferentemente é a tradição do sistema anglo-saxão, da common law, cuja principal fonte irradiadora é a jurisprudência. No sistema também chamado de costumeiro-jurisprudencial, a lei não é a mais importante fonte, sua marca caracterizadora se dá no direito baseado, primordialmente, nos usos e costumes consagrados pelos precedentes firmados através das decisões dos Tribunais.

A prática forense brasileira demonstra uma aproximação, sui generis, entre os dois sistemas de matrizes diferentes.

Vê-se, por aqui, no contexto de um direito positivado, cuja essência deveria residir no respeito estrito às leis, um modelo de vinculação às decisões judiciais, representado na figura dos precedentes judiciais, de modo que o direito acaba deixando de ser o que a lei textualmente diz para corresponder àquilo que o juiz diz sobre a lei. Conforme sintetizou Antônio Pereira Gaio Júnior[1], “não é a lei a ratio, mas sim o que a Corte afirma como a interpretação correta da lei”.

Ocorre que, afora a primeira instância, temos os Tribunais de Justiça dos Estados, os Tribunais Regionais Federais, o Superior Tribunal de Justiça e, em última instância, o Supremo Tribunal Federal, sendo que, na prática, cada juiz ou turma julgadora decide de acordo com a sua “ciência e consciência”, como gosta dizer em seus votos o ministro Marco Aurélio Mello.

Nem mesmo as Súmulas do STF, que deveriam ser vinculantes, a teor do art. 103-A da Constituição, são verdadeiramente respeitadas, basta ver a dificuldade que muitos defensores ainda enfrentam, diuturnamente, para ter acesso à íntegra de investigações a fim de exercer a defesa técnica de seus constituintes.

O cenário é de instabilidade. As decisões dos nossos Tribunais Superiores não são respeitadas pelos órgãos de hierarquia inferior, quando, na realidade, deveria haver “um esforço conjunto do Judiciário no sentido da uniformização de suas decisões de modo a que os jurisdicionadas possam desenvolver suas atividades pautados em condutas constitucionais”.[2]

É justamente nesse contexto que se insere a recente decisão da 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que aceitou o pedido de Flávio Bolsonaro para que a investigação de suposto esquema criminosos na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro deixe a 1ª instância e passe a ser processado pelo Órgão Especial do Tribunal.

Isso porque, referida decisão, adotada por maioria de votos no TJRJ, contraria frontalmente entendimento firmado no STF, em 2018, sobre as regras de foro privilegiado, segundo o qual a prerrogativa de foro se limita aos crimes cometidos no exercício do cargo e em razão dele.[3] Ou seja, cessado o mandato ou deixando o cargo que gerava a prerrogativa de foro, o caso deve ir para a primeira instância.

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